sábado, novembro 25, 2006


Ó, Maceió, você roubou meu coração.

Estive viajando, sai de Fortaleza para ir até a capital alagoana participar da formatura de uma pessoa que quero muito bem. A moça em questão foi caso de amor a primeira vista, e como éramos amigos nunca tive coragem de me declarar pra ela, acompanhei todos os seus namoros em um sofrimento mudo. Participamos de todos os momentos juntos, mesmo eu calando aquele sentimento que existia comigo. Existia um quê de dependência de minha parte pra dela, eu nunca conseguia ter raiva dela, não conseguia me estressar perto dela, sua risada parecia expelir algum feromônio que aquietava a fera.
Eu passei no vestibular e ela persisitiu no cursinho por mais 3 anos. Todas as pessoas diziam que ela desisitisse, que seguisse adiante, tentasse um outro curso. Eu mesmo cheguei a conversar com ela, dizendo que não desisitisse, mas fizesse outro curso durante um semestre apenas para sair daquele ritmo acelerado de estudo e não se cobrar tanto. Ela persistiu, até que conseguiu. Acho que foi uma notícia que me deixou muito feliz e triste ao mesmo tempo, afinal ela iria realizar seu sonho, mas seria longe de mim. Como eu iria participar de sua vida? Como eu iria poder escutar sua risada no meio da tarde? Como, eu poderia me questionar, iria continuar sendo amigo de uma pessoa que na verdade eu sequer conhecia?
Morar em outra capital foi uma dor muito grande pra mim, eu sabia que perderia muito de sua convivência e não ouviria mais aquela risada, que é a única coisa capaz de me deixar tranquilo. Por pior que eu estivesse, por maior que fosse o meu problema, se eu ouvisse a risada dela, eu relaxava. Ela tinha esse dom sobre mim, de me deixar em outra órbita e sentir que os problemas seriam de fácil resolução. Eu ficava com cara de bobo e esquecia de me levar a sério. Aliás, essa é a maior grandeza da família Ferreira, tão sempre cheios de piadas entre si que parecem deixar o ambiente mais leve.
Nunca nos beijamos, nunca dormimos juntos e nunca dividimos nenhuma intimidade. Eu passava horas em sua casa, sentados um do lado do outro naquele maravilhoso sofá ouvindo o barulho da água na fonte em conversas intermináveis (mais da minha parte, claro. Não acho que exista silêncio que não possa ser quebrado com uma conversa fútil). Ela nunca falava dos namorados pra mim, nem alegrias e nem problemas. Talvez por isso eu tenha em mim a sensação de que ela está me guardando (eu sei que isso não é legal). Também na época em que ela passou no vestibular, e rolou um climinha entre a gente, ela havia me dito que não teria coragem de namorar a distância. Eu entendi o recado e gentilmente saí de cena. Esse foi um dos dias mais frustrantes, pois eu tinha certeza de que ela me beijaria de volta. Eu já havia feito em minha cabeça planos de viagens, dinheiro que seria guardado e meu coração já esboçava um largo sorriso.
Em Alagoas ela começou a namorar com um cara, e escondeu isso de mim. Fiquei super chateado, é verdade. Aquela sensação de que ela estava me guardando me fez ter muita raiva dela. Afinal, pq eu não deveria ser merecedor de uma tentativa? Propus a mim mesmo me distanciar dela e de sua família, por qual eu também era apaixonado. Não fui buscá-la no aeroporto naquele final de ano, não passei em sua casa nas comemorações de Natal e nas vésperas do reveillon fui grosseiro com ela pelo telefone dizendo que não poderia vê-la.
Alguns minutos depois ela apareceu no meu prédio, me abraçou e brincou, como sempre fazia em meio de sua risada se eu ia passar um ano sem vê-la. Desconversei, e fui com ela para sua casa onde me diverti horrores com seus pais, tios, primos e irmão regados a fondue e jogos. Na volta daquele dia, embora eu quisesse beijá-la, aninhá-la em meu peito e aninhar-me em seu colo, eu criei em mim a conformação de que seríamos amigos, para sempre. Ela me alegrava, me fazia sentir improtante e eu sentia, mais do que qualquer coisa, que era valorizado por aquela família.
Sabia que um afastamento seria natural e que era melhor para mim seguir adiante. Não iria mais a casa dela em sua ausência, nem telefonaria para seus pais para um bate-papo descompromissado. A única coisa que resistira era os encontros nas baladas da noite com seu irmão, que claro, eu sempre o cumprimentava.
Segui minha vida. Gostei de outras meninas, mas nunca com tanta intensidade. Minha vida parecia estar se ajeitando, e eu estava determinado com isso. Um dia me ligam de manhã e me informam que o irmão dela havia morrido. Fiquei em choque, não poderia acreditar que aquele garoto tão alegre teria tido coragem de saltar pela janela rumo ao vazio.
Fui buscá-la no aeroporto, ela nada sabia, pensava que seu irmão mais novo tinha sofrido apenas um acidente. Eu sabia que na hora que ela me visse junto aos seus pais no aeroporto a história do acidente seria apenas para que ela fizesse uma viagem tranquila. Mal chorei naquele dia em que fiquei acordado quase 48hs. Fui presença constante de sua família naqueles dias de velório e enterro. Eu não poderia jamais me afastar novamente daquela família que eu amava tanto, eles iam precisar de um ombro amigo, principalmente quando ela tivesse que retornar para Alagoas.

Quando voltei pra casa, com aquele pesar de cansaço e sofrimento mal deitei na cama, adormeci. Não passei nem 15 minutos adormecido e acordei aos prantos, não conseguia falar, respirar direito, só chorar. Chorei muito naquela noite, na minha cabeça passavam as imagens, o pensamento de como aquela família tão amorosa iria sobreviver aquele baque e mais ainda, o que eu poderia fazer para ajudá-los. Até hoje eu não consigo lembrar daquele dia sem sentir minha respiração pesar. E até hoje é difícil entrar naquela casa e não ver aquele moleque brincalhão.
Passei meses sem sair de casa, minha vida era trabalho, faculdade e visitas diárias aos pais dela. Almoçava com a mãe dela quase todos os dias ou um café da tarde. No final de semana ligava, dava uma aparecida para um bate-papo. Minha visita era longa tanto quanto precisasse e tão curta quanto fosse necessária. Ela, apesar de seu sorriso e doçura é uma pesoa trancada. Raras foram as vezes que eu a ouvi lamentar ou chorar. Um dia ela me ligou e agradeceu por tudo que eu fizera até então pelos pais dela. Eu quis dizer que eu fazia aquilo por eles e não só por ela, pois eu sabia que ela tinha certeza de meu amor, mas não achei necessidade. Ela sabia que o que eu fazia era por amor, a todos eles. Acho que foi a única vez na minha vida em que não achei necessidade de explicar meus atos, pois aquela moça sardenta me conhecia como homem e como amigo. Foi uma grande prova pra mim, também. Ali eu descobri que meu amor transcendia o interesse. Não era um duelo de cavaleiros que disputavam a princesa na torre, era apenas fazer o que eu achava certo. E tudo o que eu fiz, eu sei que foi muito e que foi importante, eu teria feito por qualquer uma das pessoas que amo, sem interesse envolvido. Eu me dei de coração à eles pelo simples fato de amá-los.
Fortificamos muito esse laço, a mãe dela me tem como um filho que Deus deu, e já disse muitas vezes que a felicidade dela seria em me ter como genro. Essas declarações não surtiram mais efeito em meu coração, eu estava em outra, determinado a seguir adiante com minha vida.
Lembro que um dia eu estava com uma paquera e amigos e liguei para ela de madrugada, ela me atendeu com a doçura de sempre e eu comecei a chorar. Não lembro direito o que falei, mas tenho certeza que disse o quanto eu lamentava não poder fazer mais. Eu sempre quis resolver os problemas do mundo.
Passei a me relacionar mais com algumas meninas e passei a vê-la como uma grande amiga. Me apaixonei por outra, estava decidido a ir embora pra Brasilia e tentar uma vida juntos. Fui para sua formatura como uma pessoa feliz em participar dessa grande conquista. No dia em que cheguei fomos todos, eu e a família dela vinda de todo o país, para uma boate. O excesso de bebida, a música e a alegria de estar ali me animaram a noite inteira. Eu era a animação em pessoa, a melhor companhia que alguém pudesse ter para se divertir, só faltava ser rico e bonito :P . Morri de ciúmes ao ver a minha outrora amada no palco dançando com o cantor da banda. Fomos para o hotel, dormi pouco e estava no outro dia ávido por mais festa.
Senti ciúmes quando soube que o ex-namorado (na verdade ex-ex-ex) deu uma jóia enorme de presente e disse que queria voltar o namoro. Tudo que eu pude fazer foi furtar o capelo que ela teria que devolver na saída da colação para que pudesse guardar de lembrança.
Senti mais ciúmes ainda quando soube que a mãe dela queria que ela voltasse com o tal cara.
A festa foi linda, a música perfeita, participei de todos os momentos, bati muitas fotos dela e fiz o meu papel de coadjuvante. A festa era dela e para ela. Seus tios, avós e mãe foram embora por volta das 3 da manhã e pensei em ir junto. Fazia dois dias que não dormia direito e estava cansado. "Não, você não vai não. Fica, por favor". Fiquei, e me diverti. Participei daquele momento como família ao lado dela, de seu pai, suas primas e tia que ainda ficaram. Sentamos, dividimos o restante das doses de Chivas e dançamos.
Quase no final da festa eu comecei a chorar, as lágrimas corriam fartas sobre meu rosto e ficou impossível de esconder, mesmo dando um passo para trás. Seu pai me abraçou, perguntou o que estava passando pela minha cabeça e pq eu estava chorando. Eu apenas respondi que nada e ele não insistiu. Sua tia veio falar comigo, me abraçou e disse que eu era um homem maravilhoso, que merecia tudo de bom que a vida podia oferecer. Eu me sentia feliz e chorei por isso. Eu estava emocionado em vê-la conquistar o seu sonho. Me lembrei de todas as vezes que fui deixá-la em aeroportos ou ônibus de excursão para desejar que fizesse boa prova, em caronas divididas para aulas e testes simulados e em quando ela me disse que havia passado. Eu chorava por aquilo, e nada mais.
No outro dia nos divertimos em uma aventura ao aeroporto em deixar seus tios e avós em cima da hora, parecendo cena de filme com gente correndo pelo aeroporto com malas nas mãos gritando para irem mais rápido. Todos embaracaram e participei até da foto oficial da família na capital alagoana, por insistência deles.
Almoçamos em um lugar lindo próximo a Maceió e ela pediu para eu voltar dirigindo. Recostou sua cabeça no meu ombro e só acordava quando eu pedia orientação. Chegamos no flat, ela passou a mexer no meu cabelo, tomamos café e torrada com geléia de amora (estou viciado, quero mais). Sentei na cama junto com sua tia e prima para conversar e ela deitou no meu colo, mexi em seu cabelo e acarinhei sua orelha até ela dormir. Tive vontade de ir me deitar no sofá cama para descansar, de ir ao banheiro, de ir a cobertura olhar o por do sol no mar de Maceió, mas fiquei ali com aquela menina sardenta em meu colo dormindo tranquila e feliz.
Foram me deixar na rodoviária, todos falaram comigo, me abraçaram e ela ficou por último. Não que eu tenha deixado ela por último de propósito, mas porque ela se deixou por último. Ela me abraçou forte e não soltava, me deu três beijos em meu pescoço e agradeceu por tudo. Naquela hora eu fiquei agradecido por existir alguém que dava valor a minha pessoa e sai sem olhar para trás, ainda inebriado pela falta de sono sem pensamentos na minha cabeça. No meio do caminho ela grita perguntando se eu sabia aonde deveria embarcar, disse que sim e fui ao ônibus.
Acomodado em meu assento passei uma mensagem para seu celular parabenizando pela conquista, dizendo que estava feliz em ver que ela tinha conseguido, que de agora em diante o sucesso seria seu caminho. Ela não costuma me mandar sms, prefere ligar a mandar mensagem, e meia hora depois meu telefone bipou, pensei que fosse de alguma outra pessoa.
"Você é muito importante para mim! Obrigada por tudo. Beijos no coração!"
Então a caixa foi aberta. Eu não sei mais o que fazer ou como agir. Eu não consigo parar de pensar nela, visualizar um futuro juntos, de lembrar o que eu pensei na primeira vez que a vi. Eu passo a desejar ela dormir no meu colo novamente, de acariciar sua orelha e de acordar e dizer "você está linda". Já pensei em milhares de coisas que devo dizer quando ela voltar definitivamente para minha cidade dia 15 de dezembro. E de tudo o que pensei é que eu devo parar de ser covarde e passar essa responsabilidade para ela. Eu devo, mais que tudo me dar essa chance. Eu mereço a chance de um relacionamento saudável.
E nem mesmo eu tenho idéia e nem consigo expressar o quanto estou feliz e preocupado. Não tenho medo da negativa, pois tenho certeza que vai dar certo, mas existe em mim uma insegurança que não sei explicar o que é. Ela me conhece, sabe quem sou, o quanto sou dedicado e amoroso, o quanto prezo o conceito de família e o quanto quero constituir uma. Temos quase 30 e já passamos da idade de ser meninos que se rendem a paixões febris.
Amor, companheirismo, lealdade.... é isso que realmente importa na vida.

Alguém consegue entender o que estou passando?